Os adoçantes sem ou de baixas calorias podem ajudar na redução calórica e na perda de peso, de acordo com uma nova revisão apoiada pela OMS

Autor(es): Vicky Pyrogianni, MSc, Dietitian – Nutritionist, Nutrition Science Director, International Sweeteners Association (ISA)

Uma apreciação crítica da revisão sistemática realizada por Rios-Leyvraz e Montez sobre os efeitos na saúde dos adoçantes sem ou de baixas calorias

Destaques

  • Os resultados do novo estudo apoiado pela OMS confirmam que os adoçantes sem ou de baixas calorias podem ser eficazes na ajuda à perda de peso, que quando utilizados em vez dos açúcares resultam na redução calórica
  • As provas de ensaios clínicos controlados não suportam qualquer evidência de efeitos nocivos no controlo glicémico e na saúde cardiometabólica, ao contrário dos resultados de estudos observacionais que são propensos a causalidade inversa e a fatores de confusão residuais
  • Os adoçantes sem ou de baixas calorias são seguros, incluindo durante a infância e a gravidez, como tem sido repetida e consistentemente confirmado pelas autoridades competentes em matéria de segurança dos alimentos em todo o mundo

 

Três anos após a publicação de uma revisão sistemática realizada por Toews e colegas1 encomendada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), com o objetivo de estudar a associação entre o consumo de adoçantes sem ou de baixas calorias e os resultados em termos de saúde, foi realizada uma revisão atualizada e maior conduzida por Rios-Leyvraz e Montez2, superando várias das limitações do estudo original.

O que é que o estudo concluíu?

Os resultados da nova revisão sistemática e meta-análise apoiada pela OMS são consistentes com as conclusões das recentes revisões aprofundadas e sistemáticas que apoiam um papel benéfico dos adoçantes sem ou de baixas calorias quando utilizados no lugar dos açúcares na alimentação.3,4,5 As presentes meta-análises de ensaios controlados e aleatorizados (RCT), o padrão de excelência, a “norma de ouro”, na investigação em matéria de alimentação e nutrição, mostrou que a utilização de adoçantes sem ou de baixas calorias resultou em reduções nos açúcares (aproximadamente 39 g por dia) e no consumo total de energia (aproximadamente 134 kcal) e, por sua vez, numa pequena mas significativa diminuição do peso corporal e da adiposidade a curto prazo, especialmente em adultos, e quando utilizados no lugar dos açúcares, tendentes a uma redução no consumo total de calorias. Enquanto os autores analisaram um menor número de estudos realizados em crianças, a revisão aponta para uma moderada evidência de certeza do estudo realizado por de Ruyter et al6, um RCT grande e bem conduzido em que as bebidas açucaradas foram substituídas por bebidas com adoçantes sem ou de baixas calorias, que concluíram reduções significativas no peso corporal, z-score de IMC, no perímetro abdominal e na massa gorda nas crianças.

Além disso, os resultados das meta-análises de RCTs confirmaram que os adoçantes sem ou de baixas calorias não têm um impacto adverso nos fatores de risco cardiometabólico, incluindo os níveis de glicose e insulina, lípidos no sangue e pressão arterial. Isto também está de acordo com as revisões sistemáticas e meta-análises anteriormente publicadas em adultos saudáveis, bem como em pessoas em risco de ou com diabetes.5,7,8,9

A nova revisão também examinou provas de estudos observacionais sobre uma série de resultados em termos de saúde. Ao contrário das evidências de ensaios clínicos controlados que indicam a ausência de efeitos adversos, os resultados de estudos de coorte prospectivos sugerem que uma maior ingestão de adoçantes sem ou de baixas calorias está associada a um risco acrescido de obesidade, diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares, e mortalidade por todas as causas. Contudo, a evidência foi classificada com um grau de muito baixa a baixa certeza, apontando para limitações dos estudos de observação e para a elevada possibilidade de as associações relatadas serem parcial ou em grande parte resultado de uma causalidade inversa e/ou fatores de confusão residuais. Os autores concluem que é necessária mais investigação para determinar se as associações observadas são genuínas ou resultantes de uma causalidade inversa e/ou fatores de confusão residuais. Ao interpretar os resultados dos estudos de observação, é importante considerar que a totalidade das conclusões das meta-análises dos RCT não confirmam estes resultados. Os RCTs não indicam qualquer efeito adverso da utilização de adoçantes sem ou de baixas calorias em fatores de risco cardiometabólico e, portanto, um mecanismo plausível que poderia explicar as associações relatadas na investigação observacional não foi confirmado em estudos clínicos controlados bem conduzidos.

O estudo também não relatou associações significativas entre a ingestão de adoçantes sem ou de baixas calorias e vários tipos de cancro ou mortalidade por cancro em estudos de caso-controlo ou meta-análise de estudos de coorte prospectivos. No entanto, e ao contrário de estudos anteriores, este estudo relatou uma associação positiva entre a ingestão de sacarina e o cancro da bexiga com base em meta-análises de estudos de caso-controlo, que tinham décadas, com importantes limitações e sério risco de enviesamento. Dada a baixa qualidade dos estudos, as provas foram classificadas com um grau de muito baixa certeza. É importante notar que a segurança e a falta de carcinogenicidade de todos os adoçantes sem ou baixas calorias é confirmada pelas autoridades competentes em matéria de segurança dos alimentos em todo o mundo, na sequência de extensas revisões de avaliação de segurança das provas colectivas de estudos epidemiológicos e de carcinogenicidade, que não foram de todo consideradas no presente estudo.10

Por fim, o estudo analisou dados observacionais relativos ao consumo de adoçantes sem ou de baixas calorias durante a gravidez, concluindo que é necessária uma maior investigação neste grupo populacional, para o qual os estudos de coorte prospectivos sugerem possíveis efeitos desfavoráveis do maior consumo de adoçantes sem ou de baixas calorias sobre o risco de nascimento prematuro e possivelmente adiposidade nos filhos mais tarde na vida. No entanto, as provas foram classificadas com um grau de certeza baixa a muito baixa devido a importantes limitações destes poucos estudos. As autoridades reguladoras em matéria de segurança dos alimentos em todo o mundo, incluindo o Comité Misto FAO/OMS de Peritos em Aditivos Alimentares (JECFA)11, a Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA) 12, e a agência norte-americana US Food and Drug Administration13, confirmam que os adoçantes sem ou de baixas calorias são seguros, incluindo durante a gravidez e a lactação. Para a avaliação da segurança individual dos adoçantes sem ou de baixas calorias, estas autoridades reguladoras analisam todos os dados disponíveis de estudos de toxicidade reprodutiva, pré-natal e de desenvolvimento e uma série de testes para possíveis efeitos no acasalamento, concepção, desempenho reprodutivo, fertilidade, duração e resultados gestacionais, desenvolvimento esquelético e de órgãos, e crescimento e desenvolvimento neonatal.14

Porque é que este estudo é importante?

A presente revisão sistemática é uma atualização de um estudo anteriormente publicado por Toews et al1, encomendado pela OMS, com o objetivo de informar o próximo projeto de orientação da OMS sobre a ingestão de adoçantes sem ou de baixas calorias para adultos e crianças.

Na sequência da publicação da orientação sobre o consumo de açúcares livres da OMS15 e das recomendações globais que apelam à redução do consumo excessivo de açúcares, foram utilizados adoçantes sem ou de baixas calorias como uma estratégia bem-sucedida para ajudar a apoiar a redução de açúcares. Dada a sua contribuição para os esforços de saúde pública no sentido de reduzir o consumo de açúcares, a OMS considerará as conclusões deste novo estudo, juntamente com os resultados das revisões anteriormente encomendadas1,8 para esclarecer as suas orientações sobre o consumo de adoçantes sem ou de baixas calorias.

No entanto, enquanto os estudos supracitados apoiados pela OMS analisaram os efeitos a médio e longo prazo dos adoçantes sem ou de baixas calorias na saúde cardiometabólica, os importantes benefícios a curto prazo da utilização de adoçantes sem ou de baixas calorias em vez do açúcar, por exemplo no controlo da glicemia pós-prandial e na saúde oral, também devem ser considerados ao avaliar o seu papel global na alimentação. Estes benefícios foram também reconhecidos pela Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA) num parecer científico publicado em 2011, afirmando que “O consumo de alimentos que contêm adoçantes sem ou de baixas calorias em vez de açúcar induz um menor aumento da glicose no sangue após o seu consumo em comparação com os alimentos que contêm açúcar” e “contribui para a manutenção da mineralização dos dentes”.16 Ao contrário dos açúcares, os adoçantes sem ou de baixas calorias não são ingredientes fermentáveis, e não contribuem para a cárie dentária.17,18

Ter em consideração a hierarquia de provas nas decisões de saúde pública

Resultados contraditórios entre revisões de estudos observacionais e de RCTs já foram relatados anteriormente na literatura.19,20 No entanto, os peritos manifestaram a sua preocupação quanto ao peso que deve ser colocado nos dados de observação para resultados em que existam provas de estudos clínicos controlados e aleatorizados.21

As inexatidões resultantes dos métodos de avaliação do consumo auto-reportado de adoçantes sem ou de baixas calorias e as questões com fatores de confusão residuais e causalidade inversa suscitam preocupações quanto à fiabilidade e interpretação das associações a partir de estudos observacionais.10,22 Os estudos observacionais, por natureza, não podem provar causa e efeito e, portanto, os dados epidemiológicos são classificados como sendo de baixa qualidade e são, portanto, considerados “fracos” pela OMS. 23 Em todas as revisões apoiadas pela OMS,1,2,24 os autores salientam que os resultados de estudos observacionais sobre os efeitos na saúde dos adoçantes sem ou de baixas calorias devem ser interpretados com cautela, e a atenção deve centrar-se na confusão residual plausível, bem como na causalidade inversa (“uma associação positiva entre o consumo de NNS [edulcorantes não nutritivos] e o ganho de peso em estudos observacionais pode ser a consequência e não a razão do excesso de peso e da obesidade”). Isto reforça a importância da avaliação da hierarquia de provas, particularmente quando se considera a investigação para informar as decisões de saúde pública, que exigem um resumo da melhor qualidade da prova disponível.

Comentários finais

As provas de melhor qualidade das meta-análises de RCTs, tal como avaliadas nesta revisão, confirmam que o consumo de adoçantes sem ou de baixas calorias leva a uma redução significativa no consumo de energia, principalmente quando comparado com os açúcares, e, por sua vez, podem ser eficazes na ajuda à perda de peso a curto prazo, sem afetar o controlo global da glicose e outros fatores de risco cardiometabólico. Na presença de provas de maior qualidade provenientes de RCTs, as provas com um grau de baixa certeza provenientes de estudos observacionais devem ser interpretadas com cautela, uma vez que a confusão residual e a causalidade inversa podem influenciar parcial ou largamente as associações observadas, uma questão que deve ser abordada na investigação e trabalhos futuros.

  1. Toews I, Lohner S, Ku?llenberg de Gaudry D, Sommer H, Meerpohl JJ. Association between intake of non-sugar sweeteners and health outcomes: systematic review and meta-analyses of randomised and non-randomised controlled trials and observational studies. BMJ 2019;364:k4718
  2. World Health Organization, Rios-Leyvraz, Magali & Montez, Jason. (‎2022)‎. Health effects of the use of non-sugar sweeteners: a systematic review and meta-analysis. World Health Organization. https://apps.who.int/iris/handle/10665/353064. License: CC BY-NC-SA 3.0 IGO
  3. Laviada-Molina H, Molina-Segui F, Pérez-Gaxiola G, et al. Effects of nonnutritive sweeteners on body weight and BMI in diverse clinical contexts: Systematic review and meta-analysis. Obesity Reviews 2020;21(7):e13020
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  15. World Health Organization (WHO). Guideline: Sugars intake for adults and children. Geneva; WHO 2015. Available at: http://www.who.int/nutrition/publications/guidelines/sugars_intake/en/
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